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Produção nacional de games cresce, mas investimento ainda é pouco

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Em 2021, diversos lançamentos nacionais se destacaram, mas profissionais cobram maior reconhecimento

Kaze and the Wild Masks
Kaze and the Wild Masks tem aprovação de 97% dos usuários do Google (Foto: Reprodução)

Por Leon Sanguiné – leon@cidadeinvisivel.art.br

A gente não quer só jogar, a gente quer produzir, ganhar e nos ver representados. Acostumados a ter o controle nas mãos, os brasileiros cada vez mais buscam formas de estar no controle da produção dos games, uma área em constante crescimento por todo o mundo. O resultado de empenho e estudos foi um 2021 qualificado, com títulos destacados lá fora – e também por aqui, o que é muito importante. A luta por mais investimento, porém, parece ainda bem longe de se encerrar.

De acordo com relatório da Pesquisa Gamer Brasil (PGB), do ano passado, 72% dos brasileiros têm o costume de consumir jogos eletrônicos, em variadas plataformas. Em outro estudo, da Visa, foi apontado que o mercado em geral de games, no Brasil, teve um crescimento de 140%, muito por conta do isolamento social resultante da pandemia de coronavírus. E se jogam, os brasileiros também passaram a produzir com intensidade os próprios jogos nesse período, cada vez com mais qualidade. 

É o caso de Horizon Chase Turbo: Senna Sempre, desenvolvido pelo estúdio gaúcho Aquiris. O jogo venceu o Brazil Game Awards (BGA) como melhor jogo brasileiro do ano e sua versão anterior já havia sido, em 2016, nossa primeira produção a vencer a categoria principal do BIG Festival, maior evento de games independentes da América Latina. 

A coelha

Kaze and the Wild Masks: game chegará aos consoles ao estilo anos 90
Em Kaze, a protagonista parte em jornada pra salvar o amigo Hogo de uma maldição (Foto: Reprodução)

Outro destaque de 2021 foi Kaze and the Wild Masks do estúdio PixelHive, jogo com atmosfera noventista em que a coelha Kaze parte em jornada para salvar o amigo Hogo de uma maldição que espalhou o caos. O jogador enfrenta vegetais vivos enfurecidos invocando os poderes das Máscaras Selvagens.

Co-fundador do estúdio e sound designer e compositor de Kaze, Paulo Bohrer conta que o jogo surgiu da paixão coletiva da equipe por jogos dos anos 80 e 90. “Kaze and the Wild Masks é uma carta de amor aos platformers clássicos que crescemos jogando. Meu destaque seria para tudo que faz esse gênero de jogos ser tão querido: diversas mecânicas de gameplay, momentos desafiadores de plataforma, itens coletáveis, trilha sonora temática com fortes melodias, arte vibrante e colorida, muitos inimigos e chefões, e claro, uma carismática coelha heroína para conduzir essa aventura toda.”

O PixelHive surgiu dessa união em torno de Kaze, em meados de 2015, quando uma gama de desenvolvedores com os mesmos interesses se juntou para levar o jogo adiante. O projeto iniciou com seis colaboradores e em determinados momentos chegou a ter 15 pessoas trabalhando simultaneamente. Como resultado, Kaze and the Wild Masks foi um dos primeiros jogos brasileiros lançados na Google Stadia, a plataforma de games do Google, e teve uma recepção calorosa entre o público, que deu ao trabalho uma média de análises “Extremamente Positivas” na Steam, e tão boa quanto na crítica – a média no Metacritics é de 82 pontos.

Nordeste

Língua on Steam
Destaque de 2021, Língua valoriza a cultura brasileira no universo dos games (Foto: Reprodução)

Outro destaque brasileiro de 2021 foi Língua, criado pelo desenvolvedor Guilherme Giacomini. Assim como Kaze, o jogo apostou na estética dos games noventistas, misturada ao cenário do nordeste brasileiro. O jogador acompanha a história de Beto, um garoto tímido que mora com a família em uma pequena casa na caatinga. Quando o último animal da propriedade some, ele se depara com jornada inesperada que entrelaça a realidade e o folclore brasileiros. 

Língua surgiu a partir da aprovação de Giacomini em um edital de produção de games, em 2015. “Decidi que teria como objetivo criar um projeto que celebrasse tanto a cultura brasileira quanto os jogos clássicos. Cresci em Salvador, minha família materna é baiana, e sempre achei que o nordeste brasileiro era muito rico e por vezes subaproveitado no espectro cultural brasileiro.” Ele ficou responsável por design, narrativa e áudio, enquanto Thomas Lessa e Felipe Barros ficaram com a arte e Gabriel Mamani com a programação.
Desafios

Trata-se de uma área de ascensão relâmpago, porém, e como tal, ainda demanda de estrutura até que efetivamente possa ser considerada um cenário tranquilo para quem nela deseja trabalhar. “Acho que temos duas grandes barreiras internas que freiam um pouco a recepção dos jogos brasileiros pelo mercado: nossa inexperiência em divulgar nossos projetos, e uma certa falta de interesse ou preconceito tanto dos jogadores quanto de alguns grandes criadores de conteúdo. No entanto, ambas as barreiras citadas estão sendo quebradas cada vez mais, com criadores e jogadores cada vez mais interessados no jogo brasileiro e os estúdios aprendendo como divulgar efetivamente os seus jogos”, comenta Giacomini. Para ele, o caminho passa por incentivos culturais e fiscais para os estúdios, legislações criadas através da consulta aos profissionais e um olhar internacional mais atento aos talentos brasileiros. 

Paulo Bohrer, do Kaze and the Wild Masks, acompanha a visão do colega, da necessidade de maior incentivo tanto dos órgãos governamentais quanto da iniciativa privada para um setor que cresce e significa oportunidade de emprego para muitos brasileiros. Ele é otimista, porém. “Apesar de precisarmos de um pouco mais de tempo para ganhar maturidade na indústria e, principalmente, de mais investimentos na área, para mim está super claro um futuro promissor para o desenvolvimento de games no Brasil.”

Escassez e controvérsias

Apesar de se colocar constantemente ao lado do setor dos games, o governo Jair Bolsonaro (PL) ainda não transformou o discurso em prática. O último grande investimento nacional no segmento se deu em 2018, quando foram destinados R$ 45 mi para produção de jogos, comercialização e complementação de investimentos privados.

Em 2021, o Governo Federal fez um investimento de R$ 10 mi no setor para realização de eventos e produção de games, com destinação para estados como Distrito Federal, onde o filho do presidente, Jair Renan, tem uma empresa.

Também, Bolsonaro liberou R$ 4,6 mi do Fundo Nacional de Cultura (FNC) para o projeto de cultura digital Casinha Games, criado pelo militante de extrema direita André Porciúncula. A verba representa quase todo o valor investido pelo fundo em 2020, para todos os setores da cultura.

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